Casas vizinhas à cratera do Metrô em Pinheiros ainda têm rachaduras

SÃO PAULO – Quase dois anos após a morte de sete pessoas na obra da futura Linha 4 do metrô, casas vizinhas à cratera, em Pinheiros, ainda apresentam rachaduras, fissuras e têm comodos interditados. Moradores das ruas Amaro Cavalheiro e Pascoal Bianco brigam na Justiça para que os imóveis sejam reformados, mas até agora não houve acordo com o Consórcio Via Amarela, responsável pela obra.

Composto pelas empreiteiras CBPO, OAS, Queiroz Galvão, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez, o Via Amarelo informou, em nota, que os imóveis destas duas ruas estão fora da área de abrangência da obra – de 50 metros – para a direita e à esquerda do eixo do túnel. O consórcio alega que os abalos estruturais são anteriores à cratera e que 94 imóveis da região foram interditados pela Subprefeitura de Pinheiros após o acidente e, após perícia, receberam reparos.

Os moradores dizem que a obra começou a abalar os imóveis antes da abertura da cratera. Em 2005, afirmam, cinco casas foram danificadas e precisaram ser demolidas. Com o desmoronamento na obra da Estação Pinheiros, em janeiro de 2007, os moradores viram surgir novas fissuras nas paredes de suas casas.

O sobrado da publicitária Roberta Marinho Cruz, de 27 anos, continua com um dos quartos interditados pela Defesa Civil. Ela mora no local com os pais e uma filha, de 2 anos.

– Dormimos no quarto que fica nos fundos do sobrado, pois tenho medo que o teto desabe – diz Roberta.

As rachaduras estão espalhadas pelas paredes da residência. A da sala começa no teto e vai até o chão. Em novembro de 2006, dois meses antes do acidente, a publicitária enviou um e-mail para uma revista semanal, para alertar sobre os riscos da obra. Ela escreveu que as detonações para a construção do túnel do metrô causou rachaduras profundas.

– Naquela época havia, pelo menos, duas detonações de madrugada. Isso abalava toda a casa. Parte do teto do banheiro caiu quando eu dava banho na minha filha – afirma a publicitária.

Na época do acidente a família chegou a passar dez dias em um hotel pois havia risco de desabamento. O custo foi pago pelo consórcio, mas depois a Justiça determinou que as famílias voltassem para as casas.

A casa da aposentada Sueli Brandina, de 52 anos, na Rua Pascoal Bianco, também tem problemas estruturais. A moradora enfia uma faca na parede para demonstrar a profundidade da fissura.

– A cada dia aparece uma rachadura nova. Além disso há vazamento no banheiro – conta.

Ela diz que faz consertos desde 2005 na casa e guarda as notas fiscais, pois tem esperança de ser indenizada. Sueli calcula que gastou R$ 15 mil em reformas.

– Agora vou esperar a decisão da Justiça – afirma.

A casa da aposentada Iza Aparecida Rosana Oliveira, de 70 anos, tem rachaduras no teto e a cobertura da garagem desabou logo após o surgimento da cratera, em 2007.

Processo pode durar décadas

O defensor público Carlos Henrique Loureiro, que representa duas famílias na ação judicial contra a Consórcio Via Amarela, disse que o processo pode durar décadas.

– A decisão deve chegar até as ultimas instâncias. O consórcio é composto pelas cinco maiores construtoras do Brasil, dificilmente eles vão admitir que têm culpa. Se fizerem isso vão ter que assumir os abalos de outras casas – explicou Loureiro.

Segundo ele, algumas famílias contrataram advogados particulares para cuidar do processo.

A ação da Defensoria Pública pede indenização por danos materiais que inclui a realização de obras necessárias para fortalecer a estrutura dos imóveis a partir de suas fundações, para eliminar os riscos produzidos pela movimentação do solo. E por danos morais “pela profunda aflição decorrente da possibilidade de ruína das casas.”





De acordo com o defensor público, um laudo elaborado por um engenheiro do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura conclui que há indícios de que as fissuras nos imóveis foram causadas pelas detonações na obra.

– Os abalos ocorreram justamente na época que estava sendo construído o túnel abaixo das casas.

Problemas começaram antes da tragédia

A Rua Amaro Cavalheiro já havia sido vítima das obras da Estação Pinheiros um ano e um mês antes do acidente com a cratera. No dia 3 de dezembro de 2005 uma casa afundou e a edícula de outra desabou devido um desmoronamento nas obras da Linha 4-Amarela. O acidente fez com que 25 moradores da Amaro Cavalheiro, abandonassem seus imóveis. A estrutura de outras três residências também ficaram seriamente comprometidas.

No dia do desabamento, por volta da 1h, os técnicos do Metrô detectaram os primeiros sinais de problemas na obra. Às 2h, a sirene, que era acionada sempre que havia uma explosão no túnel, soou, acordando os moradores. Quinze minutos depois, os moradores ouviram um segundo sinal e começaram a deixar suas casas com ajuda de funcionários do Metrô.

Em seguida ouviram um grande barulho, que era o solo das casas afundando. Às 4h, pouco tempo depois da evacuação completa das residências, a parede do túnel desabou. Com isso, a edícula de uma das residências foi completamente engolida pelo buraco que se abriu no túnel do Metrô.

A Defesa Civil interditou o trecho onde aconteceu o acidente. As cinco casas atingidas pelo desabamento tiveram que ser demolidas . Os moradores foram indenizados pelo Consórcio Via Amarela e tiveram que escolher outro lugar para morar.

Por causa do episódio, a empresa tapou o trecho de túnel com concreto e o reescavou sobre uma base mais sólida. Segundo foi divulgado na época, o incidente pode ter sido causado por infiltração de água da chuva.

Cratera matou sete e desabrigou 212 pessoas

O desmoronamento na obra da futura Estação Pinheiros, na Rua Capri, ocorreu no dia 12 de janeiro de 2007. O acidente forçou 212 pessoas a deixarem suas casas – foram interditados 94 imóveis do entorno. Deste total, sete foram demolidos, 14 condenados e 73 liberados. O laudo do Instituto de Criminalística (IC) sobre o desabamento das obras constatou que vários fatores contribuíram para a tragédia, mas a causa preponderante, de acordo com os peritos, foi a não paralisação das obras um dia antes do acidente quando foram identificadas algumas anormalidades no terreno.

O relatório do Instituto Pesquisas Tecnológicas (IPT) culpou as construtoras e apontou 11 fatores que contribuíram para a formação da cratera . Entre eles, está o fato de que o projeto não levou em consideração o modelo geológico do local. Estava previsto que o túnel fosse escavado sem pressão de água, mas a investigação identificou a presença de uma coluna de água no terreno, o que contribuiu para a instabilidade das paredes.

O laudo concluiu que o consórcio teve chances de evitar a tragédia. De acordo com o Ministério Público, os responsáveis irão responder por homicídio culposo (sem intenção), que prevê pena de até 4 anos de prisão. Para o consórcio, o acidente foi “abrupto” e “imprevisível”, e não teria havido tempo de evitar o deslizamento

Fonte: O Globo





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